A revisão das projeções da taxa Selic para os anos de 2025 e 2026, com expectativa de uma elevação para 13,25% em 2025, revela mais do que ajustes técnicos no cenário econômico. Ela evidencia os desafios estruturais que o Brasil enfrenta, desafiando a narrativa de que questões econômicas podem ser resolvidas sem antes abordar as fragilidades subjacentes da política e da cultura fiscal do país.
Por que a Selic deve subir novamente? Para muitos, a resposta parece estar nos sintomas: inflação em alta, depreciação cambial e um horizonte de incertezas fiscais que corrói a confiança dos investidores. Mas há algo mais profundo em jogo. A Selic, em sua essência, é tanto uma ferramenta técnica quanto um termômetro das dinâmicas políticas e sociais que moldam nossa economia.
Inflação é frequentemente tratada como um problema técnico: corrigir demanda, ajustar oferta e calibrar expectativas. No entanto, ela reflete escolhas políticas e culturais. Gastos desenfreados, aumentos salariais desconectados da produtividade e políticas expansionistas sugerem uma visão de curto prazo, na qual o futuro é sacrificado em nome de ganhos imediatos. A alta da Selic se torna, então, uma reação quase pavloviana do Banco Central, buscando conter os excessos antes que eles se tornem incontroláveis.
A moeda de um país é um símbolo de sua credibilidade. Quando o real perde valor frente a moedas fortes, como o dólar, não se trata apenas de um jogo de oferta e demanda, mas de um veredicto: o mercado está dizendo que não confia plenamente na capacidade do Brasil de gerir suas finanças. Essa depreciação alimenta a inflação ao encarecer produtos importados, criando um ciclo que demanda, novamente, uma alta na taxa de juros.
Aqui está o cerne do problema. O Brasil vive em um estado de ambiguidade fiscal, onde promessas de responsabilidade convivem com ações que sugerem o contrário. Reformas essenciais, como a tributária e a administrativa, ainda não saíram do papel. A pressão para aumentar gastos, seja por demandas sociais ou políticas, cria um conflito perpétuo entre o que é desejável e o que é sustentável.
O Banco Central, ao sinalizar a possibilidade de uma Selic em 13,25%, está respondendo a um país que insiste em postergar suas decisões difíceis. Essa alta não é apenas uma medida de contenção; é um lembrete de que a política econômica é, em última análise, uma extensão da cultura política.
O caminho que se desenha para 2025 e 2026 não é animador. Com uma Selic elevada, o custo do crédito permanecerá alto, sufocando investimentos produtivos e pressionando famílias e empresas. A manutenção de juros altos é uma escolha cara, mas necessária em um cenário de descontrole inflacionário e desconfiança fiscal.
Se o Brasil deseja um futuro diferente, deve olhar além das taxas de juros. É preciso reconstruir as bases da confiança – confiança na moeda, na política fiscal e na estabilidade institucional. Sem isso, a Selic continuará a ser um remédio amargo para uma doença que só será curada quando enfrentarmos nossas fragilidades estruturais de forma honesta e decidida.
Em suma, a revisão das projeções da Selic é mais do que um número no boletim Focus. É um reflexo das escolhas que estamos fazendo enquanto sociedade – escolhas que nos levam, inevitavelmente, a confrontar os limites de nosso modelo econômico e político.